Sunday, August 26, 2007

Um dia.

Ele tentava, e muito. Mas nada dava certo. Ninguém sabia o porquê. Menino bom, não usava drogas, bebia- realmente - socialmente e trabalhava feito condenado. Mas nada dava certo. Nunca apostou, e sempre perdeu. Perdeu a vida, a sorte, mulheres, orgulho. E caminhava feito um morto.
Sentia-se mal a todo o momento. Caminhava de volta pra casa, dois quilômetros, todo o santo dia. Sentia-se cansado, toda a hora. Não via a hora de tudo acabar. Mas nunca pensou em acabar ele mesmo. E ninguém sabia o porquê dele ser, assim, tão forte. Menino magro, de cara pálida, sem cor alguma, só apatia nos seus olhos. Quando tinha tempo para fazer tudo o que queria, fazia nada. Ficava em seu quarto. Olhando o nada.
Um dia perdeu a vontade de ser o que não era. Sentiu-se bem. Com o que era. Um perdedor. Nesse dia encontrou sua colega de trabalho no meio da caminhada. Não era a primeira vez. Mas pela primeira vez, ela parou. Ofereceu-lhe carona. Ele entrou no carro sorrindo, sorrindo à vida. Conversaram muito pelo caminho. E quando ela perguntou o que ele gostava de fazer não soube o que dizer. Nunca sabia o que dizer, mas nunca isso o havia encomodado tanto. Parou, pesnou, parou e pensou mais um pouco. E com os lábios trêmulos respondeu:
-Gosto de não ser eu.
Sua colega espantou-se. E sorriu. Com as mão trêmulas acariciou sua cabeça. E disse:
-Que bom, finalmente alguém normal.
O pobre homem nunca foi tão feliz, e aceitou-se, pelo menos, naquele minuto.
Hoje não mora no mesmo endereço, não trabalha no mesmo lugar. Ninguém sabe onde ele está. A última notícia que tivemos dele é um pedaço de pelapel que restou no seu apartamento, que dizia:
"A normalida é uma merda".

Sunday, August 19, 2007

Nada mais.

Sozinho no campo
de imensa imensidão
do vazio
do escuro.
Só eu.
Minha cabeça gira,
como quiser,
gira.
E não vejo nada
nada é tudo que tenho.
E nada é tão bom assim.
Eu caminho no verde cor de sangue
de um pasto inexistente.
De uma vida
que inda passa
até passar.
Nos versos de um papel sujo
me perco e
nada é tão ruim assim.
Tudo é o que parece.
Nada podia ser mais triste.
A realidade se faz de fantasia
para cortar meu pulso.
E nem reflexo eu tenho.
Nada.
Só geada no pasto que não há.
Uma cacheira azul de sangue corre
e o barulho me deixa mudo.
Eu grito, um grito silencioso.
Como a da árvore na floresta vazia.
Vazio é meu peito
no meio de rostos estranhos,
que, nem ao menos,
alí estão,
só solidão.
E nem sei
o que é
nada
é o que é:
tudo
nada mais.